ANTES
DEPOIS
Eis o auge de muito tempo de trabalho, é o dia da recompensa, ou seja é um dia de festa que começa bem cedo, (este 2012 anti-troika, anti-dependência alimentar começa no seu melhor).
Por volta das oito da manhã juntam-se as pessoas, depois de um pequeno almoço bem pesado e com muita carne é costume beberem-se uns valentes cálices de vinho do porto. De seguida só três entram na pocilga e aí vem o primeiro porco para o banco de madeira. O sangrador (ainda na pocilga) enlaça o focinho do porco, assim que este consegue fixar o laço no focinho do porco a segunda pessoa pega logo no rabo do porco para servir de leme e por fim eu peguei nas orelhas afim de puxar o porco até ao banco e evitar que o laço saia.
Quando chegamos junto do banco de madeira estão então as outras duas pessoas, aí o sangrador segura bem o laço e cada um dos outro quatro pegam em cada perna do porco para o deitar no banco, enquanto isso o sangrador fixa o focinho do porco ao banco de madeira (que tem um buraco para passar a corda que está atada no focinho do porco), nesta parte o animal tem de ser dominado com muita força, a parte mais exigente são as patas de trás. A pessoa que segura a pata traseira não apoiada é pessoa que tem a maior responsabilidade ( a seguir ao sangrador, claro) pois se soltar a pata o porco pode partir o braço à pessoa que segura a pata junto ao banco...desta vez essa responsabilidade coube-me uma vez que já sei o que é ficar na pata de baixo e a outra pessoa soltar.
Quando o animal está dominado o sangrador limpa o local onde vai espetar a sangradeira e a pessoa que apara o sangue aproxima-se com um alguidar e uma colher de pau, nesse alguidar já se deve encontrar o tempero do sangue que é azeite, sal e vinagre.. assim que o sangue começa a correr a 6ª pessoa apara o sangue e não pode parar de mexer sempre no mesmo sentido até o sangue arrefecer, para assim evitar o coagulo.
Depois de alguns esticanços e guinchos o animal perde a vida e então retira-se do banco de madeira para o tractor que o vai transportar até ao espaço da limpeza externa do porco.
Em seguida repete-se todo o processo, pois os porcos são dois habitualmente porém o segundo é sempre muito mais difícil uma vez que já está enraivecido com os guinchos do seu companheiro de pocilga. Até aqui tudo correu bem a porta da pocilga resistiu por pouco ao segundo.
Depois da matança passámos ao local da chamusca do porco, antigamente usávamos carquejas a arder para chamuscar o pêlo, agora usamos um maçarico e raspadeiras de inox...assim é retirado todo e qualquer pêlo do porco...a parte mais delicada (e é só para alguns) reserva-se aos que têm as mãos mais calejadas, essa parte é a retirada das unhas que são chamuscadas até ficarem incandescentes e retiradas antes que arrefeçam.
Depois deste processo inicia-se a limpeza em detalhe com água e escovas de Leca, de seguida o detalhe aumenta e o porco passa por uma processo semelhante ao barbear humano até eliminar todo e qualquer pêlo.
Depois do processo de lavagem coloca-se o chamaril no tendão entre a rótula e a pata de trás, pois esse tendão suporta o peso do animal, então torna-se mais fácil manusear o porco, chega então o momento de retirar os órgãos genitais (seja macho ou fêmea) e ata-se a tripa, repete-se este processo no recto do porco separando a tripa da carcaça de carne atando-a claro. Prosseguindo com os trabalhos pega-se no porco e pendura-se para que se inicie o processo de desmancho da peça. Agora o trabalho é só para quem sabe e inicia-se a abertura da peça para se retirarem as tripas.
Retiram-se as tripas e duas peças iniciam o processo que se chama ''estremar'', ou seja separar as tripas, este processo é muito exigente, pois se rompemos a tripa, não só é desagradável como também é necessário atar antes e depois do furo na tripa.
Ponto de partida para um fumeiro lento daqui nascerão enchidos saborosos. |
Estremadas as tripas enquanto uns continuam o processo do desmancho da carne outros vão lavar as tripas em água corrente. E de seguida são viradas do avesso (por quem sabe, pois é um processo muito difícil, principalmente as mais finas.
Depois da tripa lavada e da carne desmanchada em peças grandes é hora do almoço.
O almoço normalmente é como se fosse uma boda, para desenjoar desta vez foram feijocas brancas grandes e uma enorme dobrada muito bem confeccionada pelo meu pai, com tudo o que uma boa dobrada tem direito para regar foi um vinho de enorme sucesso quase orgânico da Fonte Coberta, depois da dobrada chegam uns grelhados no carvão e umas sopas; a Sobremesa normalmente é constituída por vários doces regionais, nomeadamente a tigelada entre outros (excepto os do supermercado na matança não toleramos nada que provenha do capitalismo, não queremos ver na composição e18, ed25, e605...enfim nada dessas bostas... aquilo que aparece nos nossos rótulos é ovos da ti Maria da capela, chouriço do ti Manel, etc, etc.)
Local da Quinta onde se executam as lidas pós matança, a salga e o fumeiro. |
Bloco de notas da quinta:
Para aqueles a quem este post ferir as susceptibilidades, pensem naquelas empresas de matadouros onde os animais por vezes chegam à máquina de corte ainda vivos, pois alguns resistem aos choques eléctricos que usam na matança. E são mortos massivamente para alimentar hipermercados, e por vezes as carnes percorrem continentes para entrarem em mercados o mais rentáveis possível, na Quinta o processo é sustentável a 95% não fossem os 250 metros que percorremos de tractor e o maçarico para a chamusca.
Sem comentários:
Enviar um comentário